domingo, 3 de abril de 2011

A Pegada Ecológica como indicador de um desenvolvimento sustentável

O Princípio do Desenvolvimento Sustentável está expressamente consagrado no art. 66º/n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. Materialmente conexo ao ius-ambiental, arroga-se o dever compatibilizar a actuação da economia com a preservação do equilíbrio ecológico. Nessa perspectiva, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento definiu o desenvolvimento sustentável como aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades.

É, portanto, premente que se encontre um ponto de equilíbrio entre a actividade económica e o uso adequado, racional e responsável dos recursos naturais, respeitando-os e preservando-os para não comprometer o seu aproveitamento pelos cidadãos de hoje e, sobretudo, pelos de amanhã. Para que o alcance deste princípio não se circunscreva apenas à conciliação da preservação do meio-ambiente com o desenvolvimento socio-económico, releva para este efeito que se consiga encontrar uma dimensão jurídica (postulado do entendimento do Sr. Professor Vasco Pereira da Silva): concretização normativa de uma exigência de ponderação das consequências para o meio-ambiente de qualquer decisão jurídica de natureza económica tomada pelos poderes públicos e declaração da sua invalidade, nos casos de os custos ambientais inerentes à sua efectivação serem incomparavelmente superiores aos respectivos benefícios económicos, pondo assim em causa a sustentabilidade dessa medida de desenvolvimento. Exige-se que haja uma fundamentação ecológica, de modo a que as entidades públicas decisórias ponderem rigorosamente os custos ambientais Vs os benefícios económicos e que optem por abandonar os segundos quando os primeiros forem manifestamente superiores. Assim, essas decisões devem obedecer a uma sustentabilidade na sua tripla vertente: ambiental, económica e social.

Importante é também referir o Princípio do Aproveitamento Racional dos Recursos Disponíveis (art. 66º/n.º2/d) da CRP), uma vez que vem alertar para a escassez dos bens ambientais, proibindo intenções públicas que conduzam ao esbanjamento ou à delapidação dos recursos naturais. Obriga, por isso, à adopção de critérios de eficiência ambiental na tomada de decisões por parte dos poderes públicos, de modo a racionalizar o aproveitamento dos recursos naturais.

Estes dois princípios repercutem obrigações na esfera de interacção da nossa espécie com a Natureza que nos envolve. Como é sabido, cada organismo precisa de uma determinada área do espaço natural produtivo para garantir a sua sobrevivência no ecossistema. Tal como as outras espécies, o Homem depende da existência de alimentos, de um fluxo constante de energia, bem como da capacidade do meio para absorver os resíduos produzidos durante as suas actividades, de modo a que não constituam uma ameaça ao seu bem-estar. Também a disponibilidade de matérias-primas que garantem os processos produtivos das sociedades modernas é outro factor que importa considerar. As situações anteriormente descritas, associadas ao aumento exponencial da população humana, levam a considerar que o espaço físico disponível pode não ser suficiente para nos sustentar. Realizar uma avaliação relativa dos impactes que a nossa espécie já criou é fundamental para determinar se vivemos actualmente de forma sustentada.

Em 1996, Wiliam Rees e Mathis Wackernagel propuseram o conceito de pegada ecológica para avaliar a área de espaço biologicamente produtivo (terra e água) que é necessária para sustentar o actual estilo de vida, sendo ainda compatibilizados os recursos utilizados para a produção de bens de consumo e dos serviços prestados, bem como os resíduos que lhe estão associados. Embora a pegada ecológica possa ser calculada em função do indivíduo, de uma cidade ou de uma região, é comum ser calculada em relação a um País.

Esta noção põe em evidência os impactes ecológicos resultantes das actividades antrópicas, o que permite equacionar decisões urgentes que conciliem o desenvolvimento humano com o ambiente. A pegada ecológica documenta as necessidades passadas e presentes da Humanidade sobre a Natureza, podendo também ajudar na identificação das consequências futuras das nossas opções actuais.

Deste modo, é fundamental que num determinado País seja calculada a área ecologicamente produtiva, ou seja, os ambientes terrestres ou aquáticos com actividade fotossintética significativa, importante na produção da biomassa. A biocapacidade é a capacidade de produção biológica num dado ano que pode ser utilizável por um determinado país tendo em conta a sua área produtiva.

Actualmente, a percentagem de terras com capacidade produtiva que a Humanidade utiliza é muito elevada, continuando progressivamente a aumentar. Muitos investigadores indicam que esta utilização abusiva do espaço biologicamente produtivo por parte do Homem fez com que fosse excedida a capacidade sustentável da Terra por volta do ano de 1978.

O passivo ecológico de um dado país é determinado calculando a diferença entre o valor da pegada ecológica e o da biocapacidade. Se o valor do passivo ecológico for positivo, podemos inferir da existência de uma sobreutilização dos activos ecológicos desse país, sendo por isso de admitir que não é promovido um modelo de desenvolvimento que vise a sustentabilidade.

O aumento da biocapacidade impulsiona a robustez dos sistemas de suporte de vida do planeta. Em termos práticos, torna-se necessário proteger todos os ecossistemas terrestres, de água doce e marinha, e requalificar os ecossistemas degradados. É também necessário que a actual tendência de crescimento da população humana em certos países seja reduzida e até mesmo invertida. De acordo com as actuais perspectivas de um modelo de desenvolvimento sustentável, os altos níveis de consumo de recursos e de energia não são necessários para sustentar uma boa qualidade de vida.

Meadows e colaboradores referem: Nós não achamos que uma sociedade sustentável tenha de estar estagnada, chata, uniforme ou rígida. Não tem que ser, e provavelmente não poderia ser, controlada centralmente ou autoritária. Poderia ser um mundo que tem tempo, recursos e vontade de corrigir os seus erros, inovar e preservar a fertilidade dos ecossistemas do planeta. Poderia assentar na melhoria da qualidade de vida de forma comedida, em vez do aumento desmedido do consumo…

A escassez de recursos renováveis e dos recursos não renováveis pode conduzir a um problema de difícil resolução, pois não podemos viver sem água potável ou sem solos com a fertilidade necessária que garanta a nossa subsistência.

No sentido de minorar os previsíveis impactes ambientais que possam vir a acontecer nos países em vias de desenvolvimento, sugere-se que os benefícios tecnológicos possam ser transferidos dos países mais desenvolvidos para os que estão à procura desse desenvolvimento, para tornar mais leva a pegada ecológica mundial.

É fundamental, quer para a sobrevivência da espécie humana quer para as demais espécies, que se aprenda a gerir de uma forma sustentável os precisos recursos da Terra. A espécie Humana, até ao final do século XX, investiu muito pouco na preservação do nosso planeta, procurando, antes de tudo, rentabilizar em seu proveito os recursos que a Terra disponibiliza em ritmo muito elevado, o que conduziu estas riquezas, muitas delas finitas, à beira do esgotamento, face ao aumento da população e do consumo generalizado.

É urgente uma nova educação, centrada, sobretudo, na aquisição de competências que permitem promover políticas de sustentabilidade. A espécie humana deve procurar ser mais solidária e ser capaz de evidenciar uma abertura de espírito que seja sensível para escutar os sinais de alerta que a Natureza nos comunica.

Atingir a sustentabilidade será certamente um passo de gigante para a Humanidade e uma etapa fundamental do nosso percurso evolutivo, e não a alcançar será certamente hipotecar o nosso futuro como espécie neste planeta.

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