quarta-feira, 27 de abril de 2011

A ditadura da economia no mundo contemporâneo

O mundo contemporâneo enfrenta no início do séc. XXI um grande desafio, que é o da libertação das amarras da ditadura da economia que tem condicionado até hoje e sobretudo a partir da Revolução Industrial todo o processo de evolução da humanidade.

A economia instalou-se em todos os sectores de decisão dos governos, empresas e até organismos de carácter social e artístico, instaurando como regra a máxima de que tudo tem que ser rentável, sendo esta a única condição para a realização de qualquer acção, confundindo desenvolvimento com pujança económica, esquecendo-se que os factores de desenvolvimento como defende Augusto de Franco são a renda, a riqueza, o conhecimento, o poder e a sua interacção com a natureza e não os valores dessas variáveis tomados isoladamente[1]. A economia, como única variante para o desenvolvimento, instalou-se no mundo de forma desenfreada a partir da queda da ex-União Soviética, tendo trazido o mundo, enquanto aldeia global, para uma crise económico-financeira sem precedentes que se instalou desde 2009.

Vivemos o liberalismo económico, como durante a Revolução Industrial, em que o único objectivo é a redução de custos e a criação de riqueza a qualquer custo, passe-se o pleonasmo, como medida de combate à doença da própria economia mundial. Há um despique no circuito mundial, nesta criação de riqueza e as principais economias encontram-se em constante competição. O problema é que “durante o período da chamada Revolução industrial não havia preocupação com a questão ambiental. Os recursos naturais eram abundantes, e a poluição não era foco da atenção da sociedade industrial e intelectual da época”[2], enquanto que hoje o ambiente e a sua preservação são uma forte preocupação do novo milénio correndo-se o risco de, a não ser assim, chegar-se a um crescimento insustentável. Embora a questão ambiental seja já uma preocupação dos dirigentes, a ponto de terem criado cimeiras para a discutirem, as grandes economias e as chamadas “economias emergentes” fazem ainda muito pouco relativamente à questão do crescimento sustentável com a natureza.

Nesta corrida económica do mundo, a China atingiu já a segunda posição sem ter tido grande oposição dos países do mundo ocidental. A economia é o actual grande timoneiro daquele país, sendo em si mesmo responsável pelo estreitar de relações com os países europeus e os Estados Unidos da América criando, como diz Guoguang Wu, “uma situação atípica uma vez que, de um ponto de vista histórico, é a primeira vez que a China usa o poder económico com fins políticos e sobretudo porque há vinte anos atrás eram os próprios países ocidentais a usar sanções económicas para pressionar politicamente a China após Tiananmen”[3]. A economia explica e justifica tudo, permitindo uma total lassidão de medidas de protecção ambientais neste crescimento, que já faz da China o maior poluidor do planeta e a quem não interessa de todo limitações de carácter ambiental, levando-me a acreditar que poderão estar a dirigir-se em velocidade de cruzeiro para o total colapso ambiental. A ideologia do desenvolvimento chinês, que é publicamente cega no que respeita a políticas “verdes”, é um fundamentalismo economicista que não deixa ver aos seus dirigentes que, como afirma Christovam Barcellos, “o problema do desenvolvimento não é de natureza económica, nem tecnológica, mas essencialmente cultural, institucional e espiritual”[4], sublinhando o mesmo Autor que não deveria ser preciso poluir primeiro para limpar depois (o que nos reporta ao já nosso conhecido princípio da prevenção), já que os exemplos da Europa de políticas existentes no passado ilustram o que é uma situação de crise ambiental.

A actual crise financeira mundial “trouxe à tona a insustentabilidade do modelo económico baseado no mercado e nas decisões de curto prazo, abrindo caminho para um capitalismo mais regulado onde o Estado volta a ter uma posição de destaque”[5], sendo imprescindível que o problema do meio ambiente, que ultrapassa as fronteiras dos estados, seja entendido como um problema colectivo que implica uma governação global e requer uma acção conjunta de todos os países, obrigando à urgência do fim da ditadura da economia e à entrada, no palco desta governação, de outros actores para além dos economistas e, no mínimo, colocar também o desenvolvimento económico ao serviço da solução para os problemas do ambiente.



[1] AUGUSTO DE FRANCO, Porque precisamos de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável?, in Separata da Revista Século XXI, No. 3, Millenium - Instituto de Política, Brasilia, 2000

[2] MARILENA LINO DE ALMEIDA LAVORATO, As vantagens do benchmarking ambiental, in Revista Produção online, Universidade Federal de Santa Catarina, www.producaoonline.inf.br ISSN 1676 - 1901 / Vol. 4/ Num. 2/ Maio de 2003

[3] GUOGUANG WU, A shadow over Western democracies, China’s political use of economic power, in China Perspectives. N.º 2, 2009

[4] CHRISTOVAM BARCELLOS, Quem sustenta tanto desenvolvimento?, in Ciência & saúde coletiva, vol.14, no.6 Rio de Janeiro, Dec. 2009

[5] D. MAIMON, Sustentabilidade, uma onda que veio para ficar. Desafio Sustentável, América do Norte, 122 09 2009

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