Cumpre em primeiro lugar definir o que se entende por contratos de adaptação ambiental (CAA). Numa breve definição, através da celebração deste tipo de contratos o Estado compromete-se com certas entidades tendo em vista o cumprimento da legislação ambiental em vigor, ou seja, fixando-se para o efeito uma moratória para que a lei vá sendo gradualmente cumprida.
Este fenómeno de contratualização ambiental ainda não é tema assente da doutrina ou até mesmo na própria lei, tendo a possibilidade da sua admissão gerado alguns problemas de aplicabilidade prática, muitos deles que talvez não superem as vantagens teóricas que a sua consagração poderia ter. Depois de uma breve pesquisa consegui, assim, reunir alguns argumentos que me parecem de se ter em conta quanto às vantagens destes CAA. Veja-se:
- Sendo à partida o contrato um acordo de vontades, as finalidades ambientais desejadas seriam mais facilmente atingidas do que se impostas pelos meios coercivos habituais do Estado, passando a existir por parte das empresas uma mais rápida consciencialização das mesmas, através de uma auto-responsabilização acrescida conseguida por este tip
o de acordos. Ora, todos temos vantagens em beneficiar de um ambiente mais saudável, logo certos efeitos tornar-se-iam mais fáceis de atingir ao adoptar-se uma conduta de colaboração responsável. Tanto o Estado, como as empresas, como até mesmo os próprios particulares acabariam por retirar proveitos destas política;
- Os CAA podem também funcionar como um antídoto con
tra a rigidez de uma Administração demasiado centralizada, fazendo com que se reinterprete certa norma em face da realidade do caso concreto, levando a uma melhor aplicação desta. Com apoio directo nas realidades científicas do terreno conjugadas com as obrigações económicas das empresas , os contratos de adaptação ambiental, se celebrados, poderão tornar-se um poderoso instrumento de aperfeiçoamento/concretização de normas públicas em matéria ambiental;
- Por último, sabemos que a lei é, por vezes, demasiado rígida, o que não acontece tanto com o contrato, uma vez que este adapta-se a uma conjectura em constante alteração. Ou seja, com o contrato é possível fazer face às urgências reais em caso de, por exemplo, dano ecológico súbito, o que já não seria possível acontecer com a normal lentidão do processo legislativo.
Ao lerem este argumentos, certamente que muitas vozes se levantariam contra a sua admissibilidade real, dado os elevados riscos que estes CAA representam. Assim, cumpre agora enumerar as desvantagens destes contratos:´
- Logo à cabeça surge-nos uma ideia de ruptura com o princípio da igualdade entre as empresas que são partes neste tipo de contratos e as que não o são, podendo a sua celebração resultar no facto de que as empresas mais poderosas viessem a obter por esta via privilégios que não poderiam obter em face da lei, o que redundaria sempre num caso de discriminação;
- Ainda no âmbito dos princípios, e talvez o argumento com mais peso dos três que enunciarei, fala-se, nos casos em que exista a celebração destes contratos que se afaste dos limites legais, de uma violação do princípio da igualdade, uma vez que a celebração destes CAA contrariaria o art. 112º/5 da CRP;
- Não menos importante revela-se o problema do poderio que estas empresas celebrantes poderiam exercer sobre o Estado em face destes contratos, modelando estes em favor dos seus interesses e levando a que as soluções adoptadas se coadunem apenas com as suas pretensões, através de artifícios e enganos que levariam à adopção de políticas que tivessem somente como objectivo o favorecimento destas mesmas empresas. Estaríamos assim perante uma intervenção pública "privatizada", onde seria assente o risco de distorção de políticas em benefício de interesses mais poderosos.
Enunciados alguns argumentos a favor e contra os CAA, cabe agora assumir-me como uma defensora da admissibilidade destes contratos. Assim, passarei agora a refutar os argumentos de quem toma posição desfavorável nesta discussão.
Quanto ao primeiro e ao segundo argumento, parece-me que estes não poderão proceder, uma vez que não se deverão adoptar este tipo de contratos se não existirem razões suficientemente ponderosas que o justifiquem em face da realidade do caso concreto. Logo, e tal como entende o Professor Vasco Pereira da Silva, os CAA não colocam em causa nenhum princípio constitucional desde que se faça uma análise casuística ponderada, partindo-se de uma análise material dos valores em jogo, e desde que assim, valores superiores se imponham, não conduzindo a sua celebração a situações de "fraude à constituição" ou "fraude à lei".
Quanto ao último argumento, proponho como solução, e dada a imensa falta de contraditório que poderá existir nestes casos, a chamada dos particulares abrangidos ou afectados, por exemplo numa determinada área territorial específica, para serem ouvidos, manifestando a sua opinião, levando de certa forma a um condicionamento/controlo da actuação tanto da Administração como das empresas celebrantes.
Como argumento adicional à minha posição, tome-se em consideração o caso das Minas de São Domingos, exemplo esse dado pelo Dr. João Miranda na aula prática de sexta feira passada.
A Mina de São Domingos situa-se no Baixo Alentejo, na margem esquerda do Rio Guadiana, a 17 Km. da Vila de Mértola. Encontra-se inactiva desde 1966 por alegado esgotamento das suas reservas. Esta Mina encontra-se hoje abandonada e à sua volta encontramos lagoas ácidas. Esta situação coloca variadíssimos problemas de cariz ambiental, não só ao nível dos impactos paisagísticos, mas também dos ecossistemas afectados. As águas ácidas existentes são prejudiciais para os solos, contaminando-os, o que se agrava ainda mais se tivermos em conta que algumas delas servem mesmo para o consumo da população.
Pergunto-me então se este caso não será realmente um daqueles em que se revela absolutamente prioritário da parte do Estado em assumir uma conduta. Conduta essa que só será realmente eficaz se tomada com base na celebração de um contrato com o Município de Mértola, de forma a que este possa levar a cabo as medidas necessárias e específicas de reversão desta situação, que se tem arrastado ao longo dos anos sem tendência para melhorar.
Parece-me assim que o olhar de desconfiança com que a maioria da nossa doutrina encara estes contratos de adaptação ambiental deveria ser ultrapassado. Na minha opinião não estamos nestes casos perante uma alienação dos poderes da Administração, mas sim perante um reforço desses poderes na concretização de um fim que sozinha não conseguiria alcançar de forma plena, ultrapassando-se a rigidez da lei e levando a uma tomada de consciência por parte dos vários intervenientes. Tendo em conta as restrições e os cuidados já enunciados porque não então admiti-los? Porque não consagrá-los expressamente na nossa lei? Espera-se assim que, mais tarde ou mais cedo, outras respostas surjam.
(Mina de S. Domingos)
Joana de Almeida Martins, nº16654, Subturma 1.
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