Barragem do Tua - Opositores ao projecto falam em crime e ruína económico-social da região»
O processo que envolve a linha do Tua, no nordeste transmontano, arrasta-se desde 2007, depois do anúncio da construção da barragem que vai nascer na Foz do Tua e que inundará uma extensão de 16 quilómetros da linha férrea. Em Novembro de 2010, o Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR) emitiu um parecer onde garantia não haver interesse cultural em classificar a linha como património nacional. Entre os defensores da manutenção da linha, está Daniel Conde, do Movimento Cívico pela Linha do Tua (MCLT). Fala em contradições do Estado e afirma que o encerramento da linha do Tua coloca a região «mais longe do desenvolvimento».
Ana Clara | terça-feira, 8 de Fevereiro de 2011
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A polémica em torno da centenária linha férrea adensou-se nos últimos anos, porque a mesma será parcialmente submersa, numa extensão total de 16 quilómetros, por uma barragem hidroeléctrica que a EDP pretende construir na foz do Tua.
Desde logo algumas associações, movimentos e cidadãos, em geral, mostraram-se críticos do encerramento da linha. Os defensores da mesma estão preocupados não só com os impactos ao nível do património arqueológico, mas também com o património etnográfico e museológico que está em risco de desaparecer. A juntar a isso, o aumento da desertificação e do isolamento das populações colocam a região mais longe do desenvolvimento.
Mas o processo está em marcha, sendo que as contrapartidas financeiras da barragem do Tua estão já a ser negociadas pelas partes. Na última reunião que decorreu no passado dia 27 de Janeiro, no Porto, os autarcas do Vale do Tua e membros do Instituto Nacional da Água (INAG) e da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), decidiram chegar a um acordo a formalizar até ao final de Fevereiro de 2011.
Daniel Conde, do MCLT, afirma que a construção da barragem do Tua não é um facto consumado, «quanto mais não seja pelo exemplo da barragem do Côa: lá soçobra o paredão semi-construído da barragem, e um Património da Humanidade único no mundo».
No entanto, admite que a linha do Tua vive «num limbo» desde que em 2007 se começou a falar na construção da barragem. «Daqui advém como consequência directa que a perda de visitantes e de mobilidade na região já se orça em centenas de milhares de euros», indica.
70 mil passageiros em 2010:
Daniel Conde recorda que em 2010 circularam 70 mil passageiros na linha do Tua, sendo o pico da menor procura no Verão, «o que até então era impensável». «Estima-se que pelo menos 30 mil passageiros se perderam entre Junho e Setembro, só em visitantes», informa.
Para o responsável, depois de o MCLT ter lido documentos como o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT), o Plano Estratégico Nacional do Turismo (PENT) e o Plano Regional de Ordenamento do Território do Norte (PROT-N), bem como o Estudo de Impacte Ambiental (EIA) da barragem do Tua e o Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução (RECAPE), as conclusões são unânimes: «a barragem do Tua não é apenas um disparate, é um crime que está a passar impunemente pelos gabinetes da capital».
E têm sido para estes erros que o MCLT tem alertado. «Lembro que no caso do nosso parecer ao EIA da barragem do Tua, bem como os pareceres de outras associações, incluindo um partido político (Os Verdes), desapareceu sem deixar rasto, não constando da consequente Declaração de Impacte Ambiental (DIA)», acusa.
Daniel Conde prossegue nas denúncias e conta que, entretanto, a EDP construiu um «estradão ilegal» na margem direita do rio Tua. Quando alertada para este facto, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N) ordenou a reposição da margem ao seu estado original. Mas, Daniel garante que «a ordem nunca foi acatada até hoje».
O responsável lembra que existe ainda a possibilidade da providência cautelar (interposta pelos defensores da linha do Tua), mas diz que «se depois de quatro petições com dezenas de milhares de assinaturas, queixas à Comissão Europeia, acções em tribunal, uma providência cautelar só poderá, quando muito, atrasar o início das obras, o que, em todo o caso, seria um seríssimo revés para a EDP, uma vez que estando com uma dívida colossal, só está a conseguir financiamento através da criação destas barragens inúteis».
Sobre o parecer do IGESPAR que recusou classificar a linha do Tua como monumento nacional, Daniel Conde qualifica a posição daquele organismo como uma «traição ignóbil, e um vendilhismo descarado do Estado aos interesses da EDP».
«É de facto notável que aos primeiros passos do processo de candidatura da Linha do Tua a Património Nacional, o IGESPAR se tenha referido à Linha do Tua como detentora de um valor patrimonial de excepção, e depois se refira a ela como não representando “qualquer valor singular digno de referência”», lamenta, recordando que um consultor da UNESCO que a visitou, garantiu possuir todas as características necessárias para ser elevada a Património da Humanidade e que ultrapassa um dos poucos “canhões” existentes em Portugal, possuindo a maior estação nacional de via estreita e a mais alta estação dos caminhos-de-ferro portugueses, que ajudou a dar fama à alheira de Mirandela e desenvolveu todo um distrito durante 123 anos».
Retirado de http://www.linhadotua.net/3w/index.php?option=com_content&task=view&id=658&Itemid=37
Uma das facetas importantes na construção do Direito do Ambiente prende-se com o procedimento e participação ambientais. As decisões políticas, principalmente em Direito Ambiental, podem encontrar fundamento através daquilo que o professor Vasco Pereira da Silva cita no seu livro: a «legitimação pelo procedimento».
Para que a tomada de decisões seja mais correcta, torna-se essencial que os seus destinatários intervenham. A própria Constituição, no seu art. 66º, aponta nesse sentido ao prever que o direito fundamental ao ambiente depende do Estado e do envolvimento e participação dos cidadãos, sendo o procedimento o garante disse direito.
As decisões em Direito do Ambiente, e não só, são capazes de afectar múltiplos sujeitos, obrigando «à ponderação de valores e interesses contraditórios, podendo apresentar um elevado grau de complexidade técnica, podendo desencadear efeitos colaterais ou mesmo perversos» (VASCO PEREIRA DA SILVA). Daí resulta a importância de artigos como o art. 66º da Constituição ou o art. 53º do Código de Procedimento Administrativo ou ainda a própria Lei do Direito de Participação Procedimental e de Acção Popular (Lei nº 83/95)
Os actos administrativos envolvem tanto a autoridade que emitiu o acto, como os seus destinatários e ainda os privados lesados por essa actuação (titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos). Porém, é ainda reconhecido aos particulares, cujo interesse na questão seja meramente fáctico, o direito de intervir no procedimento através da Acção Popular (art. 2º da Lei nº 83/95).
É do direito à participação procedimental que trata a notícia acima documentada. Como é possível compatibilizar a visão da EDP, do Governo e habitantes e moradores desta região? Como podem os afectados fazer-se ouvir?
A intervenção é feita ao nível das «associações, movimentos e cidadãos». Comecemos pelas associações: estas vêem a sua legitimidade conferida pelo art. 53º do Código do Procedimento Administrativo, ou seja, são associações dedicadas à defesa de interesses difusos de que sejam titulares os residentes em determinada circunscrição em que se localize algum bem do domínio público afectado pela acção da Administração (v. art. 53º, nº 2, alínea b) e nº3).
As ONGA’s (Organizações Não Governamentais de Ambiente) têm também o «direito de participar na definição da política e das grandes linhas de orientação legislativa em matéria de ambiente» (art. 6º da Lei 35/98). A QUERCOS, por exemplo, têm sido uma das forças defensoras da Linha do Tua.
Parecia ficar restringida a participação ambiental apenas a sujeitos que pudessem invocar um direito subjectivo ou um interesse legalmente protegido na demanda. No entanto, dada a relevância da defesa de direitos como os ambientais, foi criado o mecanismo de Acção Popular que permite a participação procedimental de quaisquer cidadãos, desde que no gozo dos seus direitos civis e políticos, independentemente de terem ou não interesse directo na demanda (v. art. 2º da Lei 83/95).
Só com o procedimento alargado a todos os cidadãos é que será possível ouvir os vários interessados e afectados e balancear os respectivos interesses (as mais das vezes) antagónicos, permitindo chegar a um desenvolvimento sustentável.
Raquel Lemos, nº 17510, subturma 3
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