quarta-feira, 30 de março de 2011

Direito do Ambiente vs "ius aedificandi"

Assumindo o cariz de direito fundamental, o Direito do Ambiente confronta-se com os restantes direitos fundamentais. É assim que a defesa do ambiente pode justificar restrições a outros direitos constitucionalmente protegidos, como por exemplo, liberdade de construção, que alguns autores consideram inerente ao direito de propriedade. Este direito, é hoje, configurado como “liberdade de construção potencial” porque apenas se pode desenvolver no âmbito ou no quadro de normas jurídicas, nas quais se incluem as normas de protecção do ambiente.

A doutrina, tem-se dividido quanto à natureza jurídica do “jus aedificandi” e as suas relações com os planos urbanísticos.

Por um lado, existe uma corrente predominantemente privatística, defendida por Pires de Lima, Antunes Varela, Oliveira Ascensão e Freitas do Amaral, que vê a liberdade de construção como parte integrante do direito de propriedade privada do solo.

Por outro lado, uma corrente publicista, liderada pelo prof. Fernandes Alves Correia, que recusa que o “Jus aedificandi” seja uma faculdade inserida no conteúdo do direito de propriedade privada, entendendo, pelo contrário, que se trata de um poder constituído por força de um acto da Administração Pública, invocando o art. 62º./1 CRP. Para estes, o direito de construir nasce no momento do acto de planificação urbanística, se o plano permitir a aludida construção no prédio em causa.

Esta discussão da natureza jurídica do “jus aedificandi” é de maior importância dado que, a entender-se este direito como parte integrante do direito de propriedade privada, daí lhe adviria uma especial protecção jurídico-constitucional, enquanto direito fundamental de natureza análoga (art. 17º. CRP).

Para quem defenda que o “jus aedificandi” não faz parte integrante do direito de propriedade, não existe um direito de construir onde e como se quiser. Com efeito, não há constitucionalmente uma ligação directa entre a garantia da propriedade/ tutela da autonomia privada e da liberdade de construir. Portugal é um país em que o Planeamento, Ordenamento do Território e a Protecção do Ambiente são constitucionalmente protegidos, pelo que o direito de propriedade em matéria urbanística é condicionável e regulável pelo direito público.

O direito de construir está pois limitado pela sua necessária compatibilidade jurídica, com os outros interesses e necessidades constitucionalmente protegidos, nomeadamente os interesses ecológicos, que o Estado tem de realizar no actual quadro de Estado Social (ambiental) de Direito.

Deste modo, o Direito ao Ambiente deve prevalecer sobre o direito de propriedade pelo que as normas em matéria de conservação da natureza e dos recursos naturais não podem ser violadas pelo normal exercício dos direitos de uso e fruição inerentes ao direito de propriedade. O “jus aedificandi” não é uma situação jurídica decorrente e concretizadora de um direito de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias. Os publicistas entendem também que a propriedade privada não pode deter nenhum poder de decisão em eventuais alterações de classificação do uso do solo, referentes às respectivas parcelas. Tais alterações devem decorrer somente de leis gerais e de um processo de planeamento, elaborado com igualdade e obedecendo a objectivos definidos segundo regras democráticas.

Contudo uma coisa é certa: seja qual for a posição perfilhada, o direito de propriedade privada não constituiu um direito absoluto ou ilimitado, mas antes a exercer em conformidade com a Constituição e com a lei, pelo que se revela como direito submetido ao desempenho de uma função social-ecológica decorrentes das exigências de um Estado Social (Ambiental) de Direito.

As normas do direito do ambiente procuram ajudar a atingir determinados objectivos de conservação da natureza, de salvaguarda do património, de manutenção dos equilíbrios ecológicos, de preservação dos recursos naturais, de combate às diversas formas de poluição entre outros, não sendo um simples apêndice de políticas ambientais. É um instrumento privilegiado para qualquer política a favor do meio ambiente, apoiando-se em determinados princípios que lhe são característicos.

Nesta medida, concluímos por uma “superioridade” do Direito do Ambiente sobre o direito de propriedade, independentemente do caminho seguido.

Sem comentários:

Enviar um comentário