quarta-feira, 16 de março de 2011

Autonomização do Princípio da Precaução face ao Princípio da Prevenção?

Cabe elucidar, antes de mais, que, no campo da Ciência do Direito, os princípios têm uma função de ordenar, dar sentido e coerência sistemática aos conjuntos de normas positivados ou não. Ora, no âmbito do Direito Ambiental, o desenvolvimento e a formulação de princípios próprios são essenciais para garantir-lhe a autonomia disciplinar frente a outros ramos de Direito.

Assim, no que toca a este ramo de direito, temos uma acesa discussão no que diz respeito à autonomização do Princípio da Precaução face ao Princípio da Prevenção. Portanto, há doutrina que não vê a distinção entre ambos, enquanto outros, entendem que eles, embora próximos, não se confundem.

Para os defensores da autonomização, o Princípio da Prevenção, deve ser entendido, no Direito do Ambiente, como uma ideia de antecipação, chegar antes, de acção que impede a ocorrência de um mal, de tomar medidas antecipadas contra algo ou alguém. Ora, o Princípio da Precaução tem como finalidade evitar um risco desconhecido, ou pelo menos incerto.

Em síntese, no Princípio da Prevenção previne-se porque se sabe quais as consequências de se iniciar determinado acto, prosseguir com ele ou suprimi-lo. Por sua vez, o Princípio da Precaução previne-se porque não se pode saber quais as consequências que determinado acto ou aplicação cientifica causarão no meio ambiente.

Embora a diferenciação semântica não seja clara, os defensores da autonomização destes princípios, entendem que a Prevenção privilegiada a intenção de não correr riscos, enquanto que a Precaução é tomada mesmo sem saber se existem os riscos. Assim, de acordo com esta posição, poderemos diferenciar estes princípios se atendermos à finalidade de cada um. Ou seja, tratar-se-á de Princípio da Prevenção sempre que soubermos, antecipadamente, que determinada actividade causará danos ao meio ambiente; porém, estaremos perante o Princípio de Precaução quando não soubermos se determinada actividade causará danos ao meio ambiente ou não.

Há relevância em se distinguir os Princípios da Precaução e Prevenção, na medida em que este se relaciona a um risco conhecido e o primeiro a um risco potencial. Assim, quando da realização do Estudo de Impacto Ambiental, o mesmo poderá identificar a necessidade de aplicação de um ou de outro princípio que poderá determinar a concessão ou não do licenciamento ambiental. Se o risco é evidente, o estudo pode apontar medidas para que seja prevenido ou então sugerir a não aprovação do projecto. Por outro lado, se identificados apenas riscos potenciais, não havendo certeza científica quanto à extensão ou o grau dos mesmos, ainda assim o empreendimento pode não ser aprovado por conta da aplicação do Princípio da Precaução.

Porém, como dito inicialmente, há quem argumente contra a autonomização do Princípio da Prevenção e o Princípio da Precaução. É, de resto, esta a posição adoptada pela regência da cadeira, o Sr. Prof. Vasco Pereira da Silva. De acordo com o Sr. Prof., é preferível a construção de uma noção ampla de prevenção. Ou seja, ao invés de se adoptar uma concepção restrita deste principio como sendo “a de evitar perigos imediatos e concretos de acordo com uma lógica imediatista e actualista”, deverá ser preferível adoptar uma noção ampla, entendendo assim este Principio como “afastar eventuais riscos futuros, mesmo que não ainda inteiramente determináveis, de acordo com uma lógica mediatista e prospectiva, tal como permite antecipar situações susceptíveis de lesar o ambiente, quer sejam provenientes de causas naturais, quer de condutas humanas”.

Para tal, o Sr. Prof. socorre-se de critérios como a natureza linguística ou o conteúdo material, ou ainda, à técnica jurídica.

Assim, de acordo com a natureza linguística, defende o Sr. Prof. que não trás qualquer vantagem a diferenciação pois esta seria simplesmente aparente, isto porque estas duas expressões (“prevenir” e “precaver”) parecem ser sinónimas na língua portuguesa (ao contrário do que se passa na língua inglesa).

Por outro lado, no que diz respeito ao conteúdo material, o Sr. Prof., entende que não “são unívocos os critérios de distinção entre prevenção e precaução, muito menos os resultados a que conduz a autonomização desse último princípio”. Ou seja, não seria aceitável a distinção que identifica-se perigos decorrentes de causas naturais ao princípio da prevenção e identificar riscos que seriam provocados por acções humanas ao princípio da precaução, pois, na visão do Sr. Prof., na sociedade em que vivemos, será “impossível distinguir rigorosamente factos naturais de comportamentos humanos”. Para além disto, é erróneo aceitar a distinção entre estes dois princípios com base no carácter actual ou futuro dos riscos, sendo antes necessário um juízo prognose.

Relativamente à técnica jurídica, verificamos, na óptica do Sr. Prof., que no nosso ordenamento jurídico a prevenção é elevada á categoria de principio constitucional, nos termos do artigo 66º CRP, enquanto que o Principio da Precaução apenas aparece na legislação ordinária.

Em conclusão, o Sr. Prof., na adopção ampla do conceito Prevenção prefere incluir nele a consideração de perigos naturais como de riscos humanos, como lesões ambientais de carácter actual ou futuro.

Por tudo isto, cabe agora, tomar uma posição. No seguimento da posição defendida pelo Sr. Prof. Vasco Pereira da Silva, considero que ao invés de uma posição restrita do Principio da Prevenção, deve ser antes, adoptada uma noção ampla. Os objectivos do Direito Ambiental são fundamentalmente preventivos, isto é, a sua atenção está voltada para momento anterior á da sua consumação do dano – o do mero risco. Ora, a degradação ambiental, como regra, é irreparável, assim, diante da pouca valia da simples reparação, sempre incerta e, quando possível, excessivamente onerosa, a prevenção é a melhor. Para além disto, a autonomização do Principio da Precaução face ao Principio da Prevenção, irá desequilibrar a “balança” quando temos bens jurídicos do Direito do Ambiente em confronto com os bens jurídicos de outros ramos do Direito, isto porque o interesse ambiental irá prevalecer sobre os outros interesses. Assim, não é o problema de risco que está em causa propriamente, mas, o desequilíbrio que o conceito de precaução possa trazer. Por ultimo, a distinção destes princípios, no que toca ao ónus da prova, irá trazer um esforço maior, visto que, no principio da prevenção basta provar que tal acto não irá ser nocivo para o ambiente (numa óptica de probabilidade), enquanto que no Principio da Prevenção terá que se mostrar que não existe sequer a possibilidade de ser nocivo.

Ana Rita Borges Ramos, nº17157 subturma 1

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