segunda-feira, 14 de março de 2011

Constitucionalismo ambiental

A evolução da juridicidade ambiental surgiu no ordenamento jurídico português com a CRP de 1976 e com a lei de bases do ambiente de 1987.
No art.66.º da CRP estabelece-se o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, como um direito fundamental. A elevação do direito do ambiente a um direito fundamental traduz a ideia de que este direito não deve limitar-se ao recorte do ambiente como tarefa fundamental do Estado.
Neste contexto, surge posteriormente, a questão de se saber se o direito ao ambiente é um verdadeiro direito subjectivo. A primeira ideia do enquadramento jurídico-constitucional do ambiente é a de que no ordenamento jurídico português a conformação jurídico-subjectiva do ambiente é indissociável da sua conformação jurídico-objectiva.
Seguindo a posição do Prof. Vasco Pereira da Silva, ambas as realidades coexistem, ou seja, “no direito do ambiente tanto existem direitos subjectivos das pessoas relativamente ao meio-ambiente, no quadro das relações que têm como sujeitos passivos entidades públicas e privadas, como a tutela objectiva de bens ambientais”
Importa, agora, atender às dimensões essenciais da juridicidade ambiental. Segundo o Prof. Gomes Canotilho são: 1) dimensão garantístico-defensiva (defesa contra ingerências ou intervenções do Estado e demais poderes públicos); 2) dimensão positivo-prestacional (cumpre ao Estado e a todas as demais entidades públicas assegurar a organização, procedimento e processos de realização do direito ao ambiente); 3) dimensão jurídica irradiante para todo o ordenamento (vinculando todas as entidades privadas ao respeito do direito dos particulares ao ambiente); 4) dimensão jurídico-participativa (permitindo ou impondo aos cidadãos, bem como à sociedade civil, o dever de defender os bens e direitos ambientais).
No seu conjunto, as várias dimensões jurídico-ambientais e jurídico-ecológicas permitem falar de um Estado de direito ambiental e ecológico. O Estado de Direito, hoje, só é um verdadeiro Estado de direito se for um Estado protector do ambiente e garantidor do direito do ambiente; contudo, o Estado ambiental e ecológico só será Estado de direito se cumprir os deveres de juridicidade impostos à actuação dos poderes públicos
A juridicidade ambiental deve adequar-se às exigências de um Estado constitucional ecológico e de uma democracia sustentada que pense nas gerações vindouras.
Em comparação com o que acontece na doutrina dos direitos fundamentais em geral, onde se radica uma cronologia de gerações de direitos, também no campo do direito do ambiente passou a ser recorrente o recurso a uma espécie de sedimentação geológica em torno de problemas ecológicos e ambientais de três gerações. A primeira geração é referente ao período liberal, e está em causa a protecção dos indivíduos contra o Estado; a segunda geração, resulta do Estado Social, assegurando a protecção dos indivíduos (estado-administração); e uma terceira geração (em que vivemos) que visa a criação de condições para a colaboração de entidades públicas e privadas, visando a qualidade de vida através do auxílio ao direito do ambiente e à protecção da pessoa relativamente às novas tecnologias
Neste contexto importa atender à chamada responsabilidade de longa duração, a qual pressupõe a obrigatoriedade de o Estado adoptar medidas de protecção adequadas, bem como, o dever de observar o principio de nível de protecção levado quanto à defesa dos componentes ambientais naturais. Embora a CRP não consagre textualmente este princípio ele vem servindo de parâmetro no ordenamento jurídico da EU.
A Constituição não exige a protecção máxima do ambiente como pressuposto de salvaguarda do núcleo essencial do direito ao ambiente. Contudo, seria razoável, admitir um princípio da proibição do retrocesso no sentido de que as políticas ambientais são obrigadas a melhorar o nível de protecção já assegurado pelos vários complexos normativo-ambientais (constituição, tratados internacionais, direito comunitário europeu, leis e directivas.
Neste âmbito, importa também, chamar à colação outros princípios, como sejam: princípio da solidariedade entre gerações que pressupõe que as gerações presentes incluam como medida de acção e de ponderação os interesses das gerações futuras (principio interligado com o principio do desenvolvimento sustentável- art.66.º2 da CRP- e com o principio do aproveitamento racional dos recursos – art.66.º, n.º2 alínea d) da CRP); princípio do risco ambiental proporcional que pressupõe que o direito constitucional acompanhe o esforço da doutrina no sentido de alicerçar a determinação jurídica dos valores limite do risco ambiental danoso através da exigência da protecção do direito ao ambiente segundo o estádio mais avançado da ciência e da técnica.
Quanto à europeização do direito do ambiente importa referir que nos finais da década de 50, quando as comunidades Europeias foram criadas, não lhes foram atribuídas quaisquer competências em matéria ambiental. Porém, isso não obstou a que, menos de duas décadas mais tarde, a CEE adoptasse algumas directivas de protecção ambiental (directiva n.º 75/439 e a Directiva n. 75/442).
No início dos anos 70 os países europeus, com economias fortemente industrializadas, começaram a ter cada vez mais problemas ao nível da poluição. Assim sendo, os graves acidentes ecológicos, com sérios impactos ambientais, económicos, trouxeram o tema do ambiente para o centro o debate político, obrigando os Estados a tomar medidas destinadas a minorar os seus efeitos. Rapidamente surgiu a necessidade de intervenção do Estado, reparando o dano, compensando as vitimas ou responsabilizando os poluidores pelos seus actos de poluição.
Mesmo antes da introdução, pelo acto único europeu, de poderes específicos de acção no domínio do ambiente, já a Comunidade Europeia adoptava medidas de protecção ambiental.
Foi no processo de reenvio prejudicial n. 240/83 que o Tribunal de Justiça declarou expressamente que a protecção do ambiente contra perigo da poluição era um dos objectivos essenciais da comunidade.
Os marcos desta europeização são: o acto único europeu que, atribui pela primeira vez competências ambientais à Comunidade Europeia, consagrando no tratado de Roma três artigos à acção comunitária em matéria de ambiente; Tratado de Maastricht 1992- criou uma nova organização internacional regional na Europa, surgindo como nova missão o desenvolvimento sustentável não inflacionista que respeite o ambiente; tratado da União Europeia que é também um reflexo do mesmo movimento da reforma ecológica do direito constitucional Europeu, ao consagrar como objectivo da EU a “promoção de um progresso económico e social equilibrado e sustentável”; quanto ao Tratado de Amesterdão e Tratado de Nice não houve grandes alterações; por fim, o Tratado sobre o funcionamento da União Europeia (versão resultante do Tratado de Lisboa) enuncia como duas grandes chaves mestras o desenvolvimento sustentável e o nível de protecção do ambiente (arts.174.º e 175.º)
Assim sendo podemos afirmar que o direito comunitário do ambiente tem um efeito impulsionador, uma vez que, o nível de protecção elevado pelo qual se pauta a actuação ambiental da CE tem impulsionado as ordens jurídicas dos Estados Membros, conduzindo a uma evolução legislativa mais rápida.
Em geral, a evolução da própria política comunitária do ambiente tem sido mais rápida graças ao relativo distanciamento das Instituições Comunitárias face a grupos de pressão, gerando um efeito acelerador e proporcionando assim um nível de protecção ambiental que internamente levantaria sérias oposições.
Em suma, são valores como a justiça e a equidade entre as gerações, a solidariedade, a protecção de estados ecológicos essenciais e a obrigação de protecção de funções ecológicas que delimitam a extensão da dificuldade de construção de um Estado de Direito Ambiental.
No entanto, também colaboram, para a reafirmação da validade e eficácia de um núcleo central desses valores do qual depende qualquer pretensão de concretização dos objectivos ecológicos propostos pela Constituição: o direito fundamental ao meio ambiente depende, necessariamente, da concorrência de acções e da cooperação entre todos os sujeitos.
O que a Constituição (bem como os diversos diplomas europeus) enfatiza é que a protecção do meio ambiente depende de uma perspectiva de solidariedade, activa e passiva: benefícios comuns, mas também compromissos e responsabilidades comuns.
É de acordo com o aprofundamento desta noção constitucional de repartição de responsabilidades, que se deve estruturar a justificação de todo o sistema de protecção do ambiente no Direito Constitucional.

Estela Guerra, n.º17269
Turma A, Subturma:5

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