segunda-feira, 9 de maio de 2011

O crime de Danos contra a Natureza

Um pouco no seguimento do caso sugerido para a simulação de julgamento na cadeira de Direito do Ambiente, ao observar algumas das acções de alguns dos intervenientes na hipótese, decidi explorar algumas dessas acções, nomeadamente aquelas que se prendem com as descargas poluentes feitas quer em cursos de água, quer em solos.

A perspectiva a abordar será uma perspectiva penalista, fazendo desta forma a ponte entre o Direito do Ambiente e o Direito Penal, em concreto nos crimes presentes na Parte Especial do Código Penal, nos artigos 278º e seguintes.

É sobretudo sobre o crime do art. 278º CP que pretendo apresentar, este é um crime de danos contra a natureza que deve ser lido de acordo com o art.66º CRP, que consagra “um direito ao ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado” como Direito Fundamental e ainda consagra o dever de o sujeito alvo deste dever, ser ele mesmo a assegurar que tal se verifique, ao dizer que compete a todos o dever de defender esse direito.

Apesar deste aspecto deveram importante, não é essa a temática que cabe agora discutir, cabe sim, esclarecer o sentido do art.278ºCP. O dano contra a natureza surge no Direito penal com uma função acessório ao Direito Administrativo, pois desde logo o nº1 remete um dos elementos do tipo Objectivo para as “ disposições legais, regulamentares ou obrigações impostas pela autoridade em conformidade com aquelas disposições”, disto resulta que uma conduta que resulte no descrito nas alíneas a) e b) do nº1, na inobservância de tais disposições legais ou regulamentares, incorre no crime de Danos contra a natureza.

A expressão “quem, não observando disposições legais, regulamentares ou obrigações impostas pela autoridade em conformidade com aquelas disposições”, é uma norma penal em branco, o que mais uma vez demonstra a acessoriedade do Direito Penal nesta matéria, caberá ao Direito Administrativo definir os contornos e os limites de punibilidade, pois só partindo do estabelecido regulamentarmente podemos preencher esta norma penal.

A expressão é ainda relevante para o entendimento de que tipo de crime está a ser discutido, no entendimento de alguma corrente doutrinária este será um crime de desobediência, face à inobservância das disposições legais e regulamentares, contrariamente outra parte da doutrina entende este crime como um crime de dano e de resultado, uma vez que fala-se na eliminação de exemplares de fauna e flora, destruição de habitat natural e afectação de recursos do subsolo.

Existe sempre um elemento de gravidade na conduta do agente para que seja preenchido o tipo objectivo de ilícito, uma vez que este terá que eliminar os exemplares de fauna ou flora em número significativo, causar perdas nas espécies de fauna ou flora em número significativo através da destruição do seu habitat natural ou afectar gravemente os recursos do subsolo, isto denota que a conduta do agente terá de ter repercussões graves no ambiente causando um dano que dificilmente poderá ser reposto.

Assim determina o CP que o sujeito que actue de acordo com o supra descrito incorre numa pena de prisão até 3 anos ou pena de multa até 600 dias.

O nº2 do art. 278º, reporta uma situação que infelizmente ainda é usual, que é a comercialização de exemplares protegidos de fauna e flora, bem como qualquer parte ou produto obtido a partir daquele, disposição última que consegue abranger situações como o tráfico de marfim proveniente de África.

Numa forma sumaria, podemos observar que o Direito Penal conjugado com o Direito Administrativo podem construir uma arma forte ao combate aos danos ambientais, pois só com uma adequada densificação normativa da norma penal em branco do nº1 é possível punir criminalmente os agentes que negligentemente ou dolosamente actuam causando graves prejuízos ao ambiente. Contudo o maior arma passa pela consciencialização e pela educação de pessoas, sendo o recurso a juízo a último rácio, deve ser adoptada uma politica de proximidade dentro das comunidades para que os cidadãos possam estar atentos a este tipo de infracções e sobretudo ter consciência do prejuízo causado.

Pedro Quitério

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