sábado, 21 de maio de 2011

DISPENSA DE ESTUDO DE IMPACTE AMBIENTAL PARA CONSTRUÇÃO DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL DE LISBOA E VALE DO TEJO LEVANTA DÚVIDAS A DEPUTADOS DO PSD
Os sociais-democratas afirmam estar em causa o abate de cerca de 10 hectares de sobreiros. Os deputados do PSD querem ter acesso ao parecer jurídico que justifica a dispensa de Estudo de Impacte Ambiental para a empreitada de construção do Estabelecimento Prisional de Lisboa e Vale do Tejo. Num documento entregue na Assembleia da República e dirigido ao Ministro da Justiça, os sociais-democratas recordam que o Ministro fez referência a este documento durante a sua audição na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e agora querem conhecê-lo. “Uma vez que, por natureza, os pareceres jurídicos são quase sempre controversos ou pelo menos contestáveis, e atendendo a que estamos perante uma obra que implica o abate de cerca de 10 hectares de sobreiros, feita por ajuste directo e com um valor avultado de adjudicação, os deputados requerer cópia desse parecer jurídico, de forma a avaliar os respectivos fundamentos, a sua bondade jurídica e validade dos respectivos argumentos”, lê-se no documento.
http://noticiasdoribatejo.blogs.sapo.pt/634511.html

A questão que se coloca na notícia apresentada supra relaciona-se com a dispensa de procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental (doravante, AIA), prevista no art.3º do Decreto-Lei 69/2000.
Em primeiro lugar, cumpre explicitar em que consiste a AIA; trata-se de um meio jurídico ao serviço do princípio da prevenção (tem lugar num momento prévio à decisão administrativa de licenciamento de um determinado projecto - art 1º nº2); o seu objectivo principal é evitar/prevenir futuras lesões ambientais)). A AIA é um instrumento fundamental para a aplicação das políticas ambientais, que visa a integração dos objectivos de protecção e valorização do ambiente na concepção, execução, operação e desactivação de projectos públicos e privados. A AIA tem por base a realização de estudos ambientais abrangentes, incidindo sobre os elementos naturais, sociais e de património cultural , e de consultas, com efectiva participação pública e análise de possíveis alternativas, com o objectivo de recolher informação, identificar e prever os efeitos ambientais de determinados projectos, bem como de identificar e propor medidas que evitem, minimizem ou compensem esses efeitos, tendo em vista uma decisão sobre a viabilidade da execução de tais projectos e a respectiva pós-avaliação (art. 2º alínea b).
Essa decisão é emitida sob a designação de Declaração de Impacte Ambiental (art. 2º alínea g), é vinculativa para a concretização do projecto e é válida por dois anos; o procedimento de AIA termina, assim, com uma decisão sobre a viabilidade ambiental dos projectos a ele sujeitos.

No procedimento de AIA efectua-se uma consideração autónoma da dimensão ambiental dos projectos que têm um impacto significativo a nível ambiental( incide exclusivamente sobre a componente ambiental dos projectos, versando especificamente os possíveis impactos negativos no Ambiente). A delimitação do seu âmbito de aplicação encontra-se no art.1º do referido diploma, donde se retira: a verificação da obrigatoriedade de um processo de AIA é o primeiro passo a dar pelo proponente. Estão sujeitos necessariamente a processo de AIA, de acordo com o nº3 do referido artigo, os projectos incluídos nos Anexos I e II do Decreto( com a ressalva do nº 4) , bem como os projectos que, não obstante não estarem incluídos nos Anexos I e II , o membro do Governo competente em função do objecto do projecto e o membro do Governo responsável pela área do ambiente considerarem susceptíveis de causar um impacte significativo no ambiente (devido às suas características especiais, avaliadas de acordo com o previsto no Anexo IV), de acordo com o nº5 do mesmo preceito.
Não obstante o exposto, o Decreto-Lei 69/2000, no seu art. 3º, prevê a possibilidade de dispensa total ou parcial do procedimento de AIA;
A competência para a apreciação do pedido de dispensa é atribuída conjuntamente ao Ministro responsável pela área do Ambiente e ao Ministro da tutela (art. 3º nº1)
Para a instrução do pedido de dispensa, “o proponente deve apresentar à entidade competente para licenciar ou autorizar o projecto em causa um requerimento de dispensa do procedimento de AIA, devidamente fundamentado, no qual descreva o projecto e indique os seus principais efeitos no ambiente.”; a possibilidade de dispensa depende, assim, da iniciativa do proponente, mediante requerimento.
A entidade licenciadora remete o processo, juntamente com o respectivo parecer emitido, para a Autoridade de AIA, a qual, no prazo de 30 dias contados da recepção do requerimento, emite e remete ao ministro responsável pela área do ambiente o seu parecer (art. 3º nº3).
Os requisitos materiais exigidos pelo art. 3º nº 1 são a excepcionalidade e o cumprimento do dever de fundamentação. Contudo, o regime legal consagrado oferece algumas dúvidas…senão vejamos: as “circunstâncias excepcionais” de que a lei faz depender a concessão da dispensa confere à Administração uma grande margem de discricionariedade, o que se pode conduzir á concessão de dispensa relativamente a projectos em que estas circunstâncias, na verdade, não se verificam ; nas palavras do Prof. Vasco Pereira da Silva, “ (…) nem sequer se tentou uma maior densificação do conceito de excepcionalidade, estabelecendo critérios para a sua verificação”. Defende-se, assim, uma maior especificação das circunstâncias susceptíveis de integrarem o conceito indeterminado “circunstâncias excepcionai”, de modo a não colocar “na mão” da Administração o poder de apreciar e decidir de acordo com critérios definidos pela mesma ( mais concretamente, trata-se da margem de livre apreciação e decisão ).

Por outro lado, a preterição da necessidade de procedimento de AIA contraria o princípio de que é o proponente que deve demonstrar a ausência de impactos relevantes associados ao projecto, remetendo para a Administração a avaliação dos riscos que aquele eventualmente envolva. O Prof. Vasco Pereira sugere, oportunamente, que o pedido de dispensa não deveria basear-se somente na apresentação de um requerimento pelo proponente, ainda que fundamentado; ao invés, sustenta que a base do pedido deveria ser um Estudo de Impacte Ambiental apresentado pelo proponente; com efeito, se assim fosse a Administração estaria em melhores condições para se pronunciar pela concessão ou recusa da dispensa de AIA.
O preceito coloca ainda outra questão: o que se deve entender por “dispensa parcial”? Significa que a Administração iria apenas conceder a dispensa relativamente a uma parte do procedimento de AIA ou, ao invés, o que o legislador pretende é referir-se ao conteúdo da decisão de dispensa, que pode ser apenas favorável em parte ao proponente ? deve-se optar pela segunda interpretação, na senda do Prof. Vasco Pereira da Silva; neste caso, a decisão será parcialmente favorável quando a Administração concede a dispensa mas simultaneamente prescreve medidas de minimização dos impactos ambientais (art.3º nº 7).
Outra questão a analisar é a que se prende com a vinculação em relação ao parecer emitido pela autoridade de AIA(art. 3º nº4) : ora, na ausência de referência à vinculatividade do referido parecer, deve-se entender que este é obrigatório mas não vinculativo, de acordo com o art.98º nº2 do Código do Processo Administrativo.

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