sábado, 21 de maio de 2011

Princípio do Desenvolvimento Sustentável

1.Consagração internacional

O princípio do desenvolvimento sustentável foi inicialmente formulado na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Direitos Humanos, realizada em Estocolmo, em 1972 e ficou consagrado no art. 1° da Declaração aí produzida. Foi retomado no Relatório Brundtland elaborado pela Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento e o seu uso generalizou-se com a Conferência da ONU sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992. Neste mesmo ano, sob égide do Tratado de Maastricht passa a constituir um dos objectivos do direito comunitário de tal modo que certa doutrina considera que os objectivos económicos, que constituíram parte essencial da construção europeia, perdem centralidade dada a necessidade de um equilíbrio com o respeito do ambiente e a imposição da protecção ambiental como a medida e o limite de um desenvolvimento sustentável. Em 1987 a Comissão Mundial para o Ambiente, criada pelas Nações Unidas, definiu o conceito de desenvolvimento sustentável como “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades”.

2.Adopção do princípio pela CRP

Em Portugal, este princípio foi acolhido no texto da Constituição de 1997, erigindo um aspecto inovador relativamente aos valores constitucionais até então consagrados. A política do ambiente verifica-se ao nível das tarefas fundamentais do Estado – 9° e) CRP, ao mencionar que se deve defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território. No art. 66° consagra-se o direito fundamental ao ambiente e o dever de todos o defenderem. Ao Estado cabe especialmente este dever, de acordo com o n°2 do 66°, “no quadro de um desenvolvimento sustentável”. Da parte económica da CRP consta igualmente o princípio do desenvolvimento sustentável, mais concretamente na al. 81/1a ) – determina-se como incumbência prioritária do Estado, a promoção do aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas no quadro de uma estratégia de desenvolvimento sustentável.

3.Aproximação à noção de desenvolvimento sustentável e suas implicações jurídicas

Enquanto princípio jurídico a sua principal função ao nível das soluções concretas não é a de fixar critérios rígidos e fixos mas sim enquadrar a sua formulação e conteúdo e actuar como critério interpretativo ao nível de todo o ordenamento jurídico relevante. Pode actuar como critério de ponderação entre os vários direitos em questão levando inclusivamente à sua delimitação mútua. A solução em concreto pode conduzir à limitação de um direito a favor de outro mas será constitucional caso se respeitem as regras da concordância prática definidas constitucionalmente.

Este princípio dirige-se ao legislador, que deve densificar esta tarefa, mas dirige-se igualmente ao aplicador do direito. Neste sentido a sua desconsideração poderá, em último termo, levar à inconstitucionalidade das soluções adoptadas.

O princípio do desenvolvimento sustentável exige uma ponderação integrada do ambiente e do desenvolvimento económico, principalmente numa perspectiva a longo prazo. O objectivo é garantir, em termos futuros a “produtividade” contínua ao nível ambiental e económico. Esta percepção foi fruto do reconhecimento da finitude de determinados recursos, quer económicos quer naturais. É necessário, no entanto, uma maior precisão deste princípio com vista a garantir a sua operacionalidade jurídica.

4.Ambiente vs. Desenvolvimento económico

Ligar o termo “sustentável” ao desenvolvimento leva, necessariamente, à ponderação de limites neste último, os quais não podem ser determinados de modo universal, pois estão condicionados em termos históricos e ambientais. Não se trata de proteger o ambiente proibindo toda e qualquer actividade económica que o afecte, porquanto tal seria desproporcional. Trata-se, antes de mais, de encontrar uma fórmula que sintetize e revolucione o modo como é encarado o desenvolvimento e a preservação ambiental, e que é mais do que uma soma dos dois, é uma redefinição do próprio desenvolvimento. O antagonismo entre meio-ambiente e desenvolvimento não se resolve a favor de nenhum, mas sim através de uma integração na fórmula desenvolvimento sustentável: o próprio desenvolvimento económico muitas das vezes como pressuposto da promoção do ambiente e o ambiente como pressuposto do desenvolvimento económico. O ambiente passa a ser considerado não apenas como limite mas também como fundamento das actividades económicas. Todas as normas ou actividades de cariz económico que possam interferir no ambiente devem ter em consideração a sua protecção não devendo as questões ambientais ser consideradas externas à regulamentação económica ou ao desenvolvimento em geral. É imperativa a integração da variável ecológica no processo de desenvolvimento, maxime em termos económicos. Trata-se, aliás, do enunciado no Princípio 4 da Declaração do Rio, onde se precisa que a variável ecológica não deve, por seu turno, ser considerada isoladamente. Posto isto, o reconhecimento da limitação na capacidade de utilização dos recursos, no quadro da sua renovabilidade, é um pressuposto urgente a ser integrado, em termos metodológicos, na prática o ordenamento do território. No fundo, trata-se de determinar a capacidade de “carga” do meio ambiente.

A opção adoptada pelo legislador já não pode passar por um desenvolvimento económico e social que desconsidere a necessidade de garantir a sua própria sustentabilidade. Em termos económicos a sustentabilidade quer dizer “que é necessário assegurar que os ganhos económicos de hoje não se percam amanhã, por falta de recursos e do ambiente indispensável”. Exige-se um desenvolvimento económico de acordo com as condições ambientais existentes, com a sua disponibilidade e tendo em consideração a sua interacção no desenvolvimento ambiental. O princípio do desenvolvimento sustentável é assim, por natureza, um princípio integracionista mas muito flexível, dado que um dos seus vectores mais importantes é o apoio nas próprias potencialidades de desenvolvimento permitidas em cada sistema ecológico e económico, na sustentabilidade destas potencialidades encaradas não apenas em termos presentes mas também em ermos futuros.

Mas a teleologia do direito do ambiente não é proporcionar, defender, tutelar os recursos naturais para proporcionar meios produtivos à actividade económica. Preocupa-se com isso para criar condições equilibradas à vida humana, o que não exclui a utilização produtiva na actividade económica, mas não a considera como a única das finalidades possíveis de protecção dos recursos naturais”. Por outro lado é evidente que ao nível económico há igualmente preocupações ambientais e sociais, mas “o direito do ambiente pode exigir mais; pode exigir custos maiores, uma actividade mais activa do agente económico-produtivo” exigindo a internalização dos projectos das exterioridades, nomeadamente por via legislativa.

A análise económica do custo-benefício é de difícil concretização no domínio ambiental dada a inviabilidade de se avaliarem, nestes termos, certos recursos naturais. Tal vai ser permitido já não numa lógica exclusivamente económica mas através de avaliação ambiental das actividades propostas.

Voltando novamente à nossa Constituição verificamos que não se trata da defesa da submissão dos desígnios económicos ao valores ambientais, numa perspectiva ecocêntrica, mas antes a constatação que a própria CRP dá uma orientação teleológica relativamente ao modo como devem ser ponderados estes dois direitos fundamentais, quer pelo legislados quer pelo decisor que, se não renuncia ao desenvolvimento, pretende encerrar o caminho a um tipo de desenvolvimento presente nos anos 60 alterando-se as próprias prioridades de actuação. Trata-se da defesa de um desenvolvimento cujo objectivo último não pode ser a exploração exaustiva dos recursos existentes. Desde modo não cumprem a Constituição as actuações legislativas, judiciais ou administrativas que contrariem a preferência explícita da Constituição dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos. Atentos os seus objectivos, este princípio tem não só uma dimensão negativa (evitando determinadas acções) mas também uma dimensão positiva (servindo de base e fundamento para determinadas actuações).

Ao direito do ambiente deixa de ser cometida apenas a tarefa de regular as actividades humanas de modo a prevenir e remediar as perturbações que alteram o seu equilíbrio, para ser encarado como promotor e viabilizador do próprio desenvolvimento económico a longo prazo. Uma política de desenvolvimento sustentável não deve impedir o desenvolvimento económico, mas conciliá-lo com a preservação do ambiente. Neste sentido a concordância prática entre o direito ao ambiente e os direitos fundamentais de natureza económica pode levar a uma discriminação positiva. Esta discriminação é justificada precisamente pela finalidade a obter – o desenvolvimento sustentável – pelo que não constituirá uma violação do princípio da igualdade: por exemplo poderá optar-se pela autorização de uma actividade económica, em detrimento de outra, pela sua menor prejudicialidade de acordo com critérios de sustentabilidade. Só em último termo se impedirá o desenvolvimento ou se deixará de proteger o ambiente.

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